Os imóveis novos encalhados (ou em estoque) na cidade de São Paulo, maior mercado imobiliário do Brasil, já superam o recorde negativo de 2014, acumulando 28.021 unidades disponíveis para venda na cidade em abril – 1 mil acima dos 27 mil do encalhe histórico registrado em dezembro. Os dados são do Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis Residenciais e Comerciais de São Paulo (Secovi-SP).
Segundo o Secovi-SP, a oferta equivale a um estoque para 23 meses – considerando a média de 12 meses de vendas, que é de 1.230 unidades. A oferta, explica o sindicato, corresponde a imóveis residenciais novos na planta, em construção e prontos (de um ciclo de produção que conta os últimos 36, lançamentos entre maio de 2012 e abril de 2015).
Para Celso Petrucci, economista-chefe do Secovi-SP, a economia e a situação institucional atual do Brasil são complicadores para um mercado que vem patinando, depois de viver dias de glória, com grande oferta e preços abusivos, mas de grande liquidez possibilitada pelo bom momento econômico recente. “Precisamos que a confiança seja retomada, para que haja uma inflexão, uma mudança de rumo no setor. Por conta da conjuntura ruim, de inflação e juros em alta, falta de crédito e insegurança com nível de emprego, estimamos uma redução de 25% nos lançamentos neste ano”, conta o economista.
De 2010 para 2014, o estoque na cidade, principal mercado habitacional do País, cresceu 250% e a velocidade de venda acompanhou o pessimismo, gradualmente.
“Chamamos de oferta não vendida, outros chamam de encalhe. Esses números representam o fluxo do mercado hoje e é impossível negar que 2015 e 2016 serão anos muito difíceis. É claro que queríamos estar com o movimento de 2010, quando os estoques eram de 8 mil unidades.”
Segundo dados do Secovi-SP, a velocidade de vendas, indicador que mede o desempenho entre a comercialização e a oferta de imóveis novos em determinado período, é de 42% neste ano (janeiro a abril), ante os seguintes percentuais:
2014: 51,9% – 2013: 62,6% – 2012: 60% – 2011: 64,4% – 2010: 75,7
“A única alta que interrompeu momentaneamente o recuo na velocidade ocorreu em 2013, quando houve uma grande procura pelos apartamentos de um dormitório, com boa localização, atendendo a um público específico”, explica Petrucci.
Compra com 13º salário
Em um ambiente no qual os negócios ficam raros, as construtoras estão usando a criatividade ou voltando às antigas formas de financiamentos para vender os estoques do mercado imobiliário. Para aumentar a velocidade de vendas de um empreendimento em Osasco, a Construtora e Incorporadora Danpris está vinculando a entrada ao pagamento do 13º salário do comprador.
“Queremos melhorar as vendas e para isso estamos usando a criatividade. O comprador faz o contrato agora e paga mensalidades a partir de R$ 499, quando chegar em dezembro, ele paga a entrada. O negócio fica invertido no primeiro momento, mas depois se acerta o passo”, explica Dante Seferian, diretor da Danpris, empresa que há 40 anos atua na zona oeste de São Paulo e em Osasco.
Para João da Rocha Lima, professor titular de Real Estate da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, o encalhe de imóveis residenciais hoje é falta de confiança. “O mercado residencial é feito de gente que compra uma única vez. A decisão de compra ocorre de uma forma lenta e tem de ter fundamento na confiança. O cenário atual, de escassez de poupança e dificuldades de liberação de crédito pelos bancos, faz com que as pessoas pensem muito antes de tomar a decisão de fazer um financiamento que impacta de 20% a 30% do orçamento ao longo de 20 anos ou mais”, pondera.
O professor explica que os indicadores de mercado impedem a recuperação da confiança e a previsão de melhoras no curto e médio prazos. “Está imprevisível como a estimativa do PIB [Produto Interno Bruto]. Fizemos projeções bem conservadoras, mas a realidade tem sido ainda pior. No caso dos imóveis comerciais corporativos, por exemplo, o nível de vazio [ociosidade] está perto de 30% neste semestre, com preços de aluguéis despencando. Para que o investidor volte a colocar dinheiro no segmento comercial, o nível de vazio tem de ser 10%. Estamos bem longe disse e acredito que a crise do setor ainda leva uns cinco, seis anos para ser superada. Eu previa o fundo do poço para 2015, mas se o segundo semestre começar ruim como foi o primeiro, terei de adiar a previsão de fundo do poço para 2016.”
Rocha Lima aponta ainda uma consequência do mal resultado. “Há um aumento no número de distratos [rompimento de contrato] hoje porque as empresas venderam empreendimentos há três anos e estão entregando agora. Aí, quem comprou há três anos vê que o imóvel hoje vale menos do que o acordado lá atrás e não quer perder dinheiro, desfaz o negócio. Por outro lado, tem o aumento da taxa de juro e redução de crédito. Há uma inadequação entre o mercado passado e hoje. Já a pessoa que compra hoje fica se questionando se está pagando caro, se preços vão cair no futuro próximo. É a avaliação do risco e da perda de dinheiro que inibe e acentua o período negativo do mercado.”
Fonte: iG SP (14/7/15)