09 de outubro de 2014
A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a recurso especial que pedia que um imóvel de família não fosse incluído na massa falida da empresa Plásticos CB Ltda., de São Paulo. O relator, ministro Luis Felipe Salomão, entendeu que a penhora dos bens da empresa, devido à quebra do negócio decretada em 1999, não poderia ser estendida a um imóvel de família adquirido dez anos antes por um dos sócios, mesmo tendo havido a desconsideração da personalidade jurídica sob o argumento de fraude contra os credores.
“A desconsideração da personalidade jurídica não pode ser uma pena de expropriação universal dos bens dos sócios ou administradores da empresa devedora, tampouco uma solução para que todos os credores, indiscriminadamente, satisfaçam seus créditos na hipótese de insolvência do devedor”, disse Salomão.
A 3ª Vara Cível da Comarca de Guarulhos havia acolhido o pedido formulado pelo Ministério Público em agosto de 2005 e desconsiderou a personalidade jurídica da empresa para que os bens dos sócios fossem arrecadados. Segundo o MP, após decretada a quebra, alguns sócios entraram no local onde a Plásticos CB funcionava e promoveram um “saque”, levando equipamentos que estavam nas dependências da empresa.
Nobre propósito
Para Salomão, a desconsideração da personalidade jurídica, por si só, não autoriza a penhora do bem de família, a menos que o caso se relacione a uma das exceções previstas no artigo 3º da Lei 8.009/90 (a lei trata da impenhorabilidade do único imóvel residencial da família, e o artigo ressalva as hipóteses em que ele pode ser penhorado).
A desconsideração – acrescentou o relator – é um mecanismo importante para o fortalecimento da segurança do mercado, ao aumentar as garantias aos credores, mas “esse nobre propósito não se sobrepõe aos valores legais e constitucionais subjacentes à proteção do bem de família, e é bem por isso que a fraude à execução não se encontra prevista como exceção legal à impenhorabilidade de bens dessa categoria”.
Divergências
Luis Felipe Salomão disse que a questão levantada no recurso não é pacífica no STJ, que tem precedentes contra e a favor da penhorabilidade do bem de família diante de fraude contra a execução.
Ele mencionou um caso analisado recentemente pela Terceira Turma em que se discutiu a possibilidade de penhora de imóvel de família que, dias depois de seus donos serem intimados a pagar a dívida, foi doado a um menor (REsp 1.364.509). A Terceira Turma, diferentemente do que foi decidido no caso da Plásticos CB, entendeu que uma vez reconhecida a fraude contra a execução, o bem de família do devedor não deve receber a proteção legal da impenhorabilidade, sob pena de prestigiar-se a má-fé.
Segundo Salomão, as exceções da Lei 8.009 devem ser consideradas restritivamente, ou seja, não é possível aplicar analogias ou esforços interpretativos para afastar a proteção legal em situações não previstas expressamente – como no caso julgado, em que o Tribunal de Justiça de São Paulo aceitou a penhora do imóvel em razão da fraude contra os credores e da desconsideração da pessoa jurídica.
Crime
O ministro reconheceu que a conduta de subtrair bens da empresa após a decretação da falência é crime, e uma das exceções da Lei 8.009 (inciso VI do artigo 3º) é justamente a hipótese de ressarcimento de dano causado por ato criminoso, “mas obviamente nos limites do prejuízo experimentado pela vítima”. No entanto, ele observou que o inquérito respectivo foi arquivado a pedido do próprio Ministério Público com base no princípio da insignificância, em razão do baixo valor dos bens.
O relator afirmou que a proteção legal dada ao bem de família não é apenas para o devedor, mas também para sua família. De acordo com seu voto, “a determinação judicial de que, mediante desconsideração da personalidade jurídica da empresa falida, fossem arrecadados bens protegidos pela Lei 8.009 se traduz em responsabilização não apenas dos sócios pela falência do negócio, mas da própria entidade familiar, que deve contar com especial proteção do estado segundo o que determina a Constituição”.
O voto do ministro relator foi acompanhado de forma unânime pelos demais ministros.
Fonte: STJ (08/10)